O dia 9 de novembro de 1989 é de extrema importância. Nesta data, um dos maiores símbolos da Guerra Fria e da segmentação entre os campos capitalista e comunista começa a ser desconstruído: o Muro de Berlim.
Este monólito de concreto – eufemisticamente batizado de Muro de Proteção Anti Fascistas – era uma barreira física erguida pela Alemanha Oriental no ano de 1961 e que sacramentou a olhos nus a divisão tanto da cidade alemã quanto a do mundo em duas esferas, resultado das Conferências de Teerã (1943), Ialta e Potsdam (ambas em 1945).
De um lado a República Federal da Alemanha (RFA), com áreas sob o controle de Reino Unido, França e Estados Unidos. Do outro, a República Democrática Alemã (RDA), sob o domínio da União Soviética.
A separação de Berlim demonstrou de forma simples e direta o que já estava subentendido: a compartimentação do globo de forma ideológica, tendo as duas potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial liderando cada um dos âmbitos. O Muro de Berlim foi construído em segredo e, da noite para o dia, famílias foram separadas de forma arbitrária, sem poder se comunicar e muito menos decidir de que lado ficariam. A vida de muitos foi devastada por este projeto político que só visava cristalizar para o mundo as diferenças entre dois sistemas.
As tentativas de cruzar o muro foram inúmeras. Logo no início, as pessoas se jogavam contra o arame farpado que era usado na divisão. As imagens desta época e desses momentos são um claro retrato do desespero das pessoas ao tentar passar para a RFA devido aos mais diversos motivos. Os anos foram se passando e as iniciativas para transpor a barreira também. Os berlinenses orientais cavaram túneis, usaram balões, ultraleves e outros artifícios. Porém, as autoridades acompanharam estas evoluções, erguendo fortificações mais avançadas. Além disso, passaram leis e editaram ordens com instruções expressas para que os guardas que policiavam o muro atirassem para matar.
Todavia, mesmo com todo este aparato de segurança, a RDA não conseguiu conter a vontade do povo. A chegada de Mikhail Gorbachev ao poder na União Soviética resultou na abertura econômica (perestroika) e política (glasnost) não só na URSS, mas em toda a Cortina de Ferro; da qual a Alemanha Oriental fazia parte. Os ventos de mudanças que começaram em Moscou chegaram em Berlim. Os anseios por renovação podiam ser sentidos no ar, tanto que foram cidadãos comuns em ambos os lados que começaram a desconstrução figurativa e literal do muro. Primeiro, indo para as fronteiras exercendo pressão ao exigir livre passagem e depois com as mãos e picaretas derrubando o monolito que representou a bipolaridade mundial por 28 anos.
As consequências reverberaram mundo afora, ainda mais na Europa. Os governos comunistas começaram a cair – como dominós – por meio de levantes populares. A Polônia com Lech Walesa e seu sindicato Solidariedade agregando a população e indo às ruas para pedir liberdade é um exemplo. A Revolução de Veludo na antiga Tchecoslováquia, tendo o poeta Vaclav Havel à frente, outro. Não por acaso, ambos viraram presidentes de seus países com o fim dos governos comunistas. As forças da transformação foram tamanhas que dois anos depois, na noite de Natal de 1991, Gorbachev anunciava na TV o fim da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.
A noite de 9 de novembro mudou o mundo e tem repercussões até hoje e se faz presente na memória de muitos. Numa nota pessoal, esta vem a ser a minha primeira lembrança de um grande evento televisionado. Me recordo claramente de Pedro Bial diretamente de Berlim relatando os acontecimentos. A minha segunda memória vem a ser a de estar com a família no dia 25 de dezembro vendo o líder soviético comunicando o fim de um gigante e o início de uma nova era. O que começou numa fria noite de novembro alterou o curso da História, influenciou vidas e plantou a semente da sociedade mundial como a entendemos atualmente.